quinta-feira, maio 24, 2007

Fácil de agradar

sou um miúdo simples. É assim que gosto de pensar que sou, que gosto de me ver: um miúdo. Por enquanto, ainda vou tendo esse privilégio...

Não sei quando é que, um dia, vou acordar e olhar-me ao espelho, e ver uma face que não reconheço. um rosto cinzelado, uma cara cinzenta da barba por fazer, e ver um adulto. Não sei se quero envelhecer, ou não: gosto de estar assim, não sei como é estar-se mais velho. Não: sentir-se, mais velho. Sentir-me mais velho. Mais marido, mais pai, mais perto de uma morte anunciada. Não sei como é isso, sentir que dei mais um passo na jornada da minha vida. Pensava que sabia muito, aos dezassete. Mas sempre soube que não sabia nada. Agora tenho vinte anos. Vinte anos e meio, histórias para contar, e outras para tentar esquecer. Que tipo de ser humano sou? Que tipo de ser me tornei, que pessoa me fiz?

Muitas vezes gostava de ser diferente. Melhor, enquanto pessoa. Sei que há coisas que nunca conseguirei mudar. Nunca conseguirei mudar o facto de, por mais que tente ser o mais neutro possível, as pessoas dizerem sempre que não me acharam normal quando me conheceram pela primeira vez. Assusta-me um pouco a impossibilidade de ser banal. Suportável para o resto da sociedade, pelo menos. Mas não sei que diga. Não sei que pense. Não sei se devo gostar ou odiar tal característica. Porque: a vida é tão vasta... tão impossível de definir nos seus certos e nos seus errados, nos seus "talvez".
Nas suas incongruências.

Ontem vi um pedaço de luz no passeio, no meio de uma estrela desenhada a pedras pretas. Antes de morrer, pediu-me um pouco de calor, e um pouco de tempo, de presente, para poder continuar a distanciar-se da realidade. Antes que pudesse fazer qualquer coisa, morreu, enrolada sobre si mesma.
Apagando-se.
Deixando de se lembrar de ela mesma.



J.

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