quarta-feira, fevereiro 15, 2006

Uma pequena nota

Uma pequena nota acerca dos assuntos recentemente discutidos aqui n’A Navalha.
Em relação ao pequeno (grande) texto do P., o que posso dizer é que ele apanhou-me de surpresa, mas nem por isso ela foi uma surpresa negativa. O que se passa é, quando criámos A Navalha, a nossa ideia era acabar com uma ressaca de alguns meses em relação ao projecto falhado (embora alguns leitores discordem, e continuem ainda hoje a frequentá-lo, apesar de tecnicamente morto) que foi o nosso anterior blog. Muitos amigos nossos nos perguntam, porque é que não fazem textos, posts, mais críticos, mais sátiros, se o fazem normalmente no vosso dia-a-dia? As razões são várias. Em primeiro lugar, o que queríamos e quisemos fazer em relação À Navalha era um projecto específico, com rotas específicas e metas bem balizadas a alcançar. Não queríamos fazer deste blog um blog político, muito menos crítico (ou ao contrário): a nossa ideia era justamente fazer uma coisa diferente, totalmente abstracta, meramente artística – naquilo que, muito humildemente devido à falta de tempo e de jeito, nos é possível – e sem qualquer tipo de agenda social ou, até, arrisco, cultural – éramos apenas dois amigos que queriam criar um blog diferente dos que existem na blogosfera, a esse nível, mas sem ter o aspecto e carisma pesados dos outros blogs que existem (cujo nosso anterior também era exemplo) ; e em relação à agenda mais cultural, ela apareceu mais recentemente, à medida que o blog se ia naturalmente expandindo. Não o tornar demasiado íntimo, não o tornar íntimo sequer – as ideias, como são apanágio quando são lançadas entre conversas nossas, nem estão sequer bem delimitadas mas temos a rara sorte de estarmos sempre em sintonia e na mesma onda. Então, com dez minutos de conversa, ambos percebemos sem precisar de explicitar tudo um ao outro, o que queríamos com este blog. Devo admitir, ou dizer, que textos políticos não era mesmo o que queríamos – mais uma vez, queríamos uma coisa algo diferente, e se até o P. admitia excepções, por vezes, eu deixei bem claro que não, com alguma teimosia. Porque eu, na verdade, não suporto política. Não é muito normal, eu sei, até no curso onde eu ando, mas o meu interesse pela política é completamente nulo, ou perto disso. não vejo debates na televisão mais do que cinco minutos seguidos, não compro nem leio jornais. Os meus pais até estranham um pouco, e não entendem bem e já mo disseram, como é que eu fui para direito e não presto atenção a políticas, enquanto, ao mesmo tempo, vejo amigos meus ingressarem fervorosamente com algum ideal secreto e motivante que eu ainda não descobri (e, na minha opinião, por vezes completamente cego, mas que se há-de fazer…) nas Jotas, S, SD ou P. Eu, pelo contrário, já tive uma folha da JS posta à minha frente para eu a assinar com a promessa que se eu o fizesse me pagavam com sexo (oooh, as lendas que se criam com estes pequenos momentos…), e eu ri-me, declinando-a. De facto a política não me interessa, muito particularmente repugno-a, por achar que é uma actividade, pelo menos nos últimos anos, vazia de conteúdo, cuja prática, nos nossos dias actuais, o tem provado das mais variadas formas.
Se no entanto não queria textos políticos ou de nível social, não posso desprezar ou sequer não concordar com a postagem do texto do P. em primeiro lugar, porque a peça está, em si, de inegável qualidade, boa para alguns ou não tão boa para outros. Depois, as suas ideias baseiam-se em acepções que eu próprio já com outros discuti e com as quais sem qualquer tipo de reservas concordo, e finalmente, porque A Navalha é democrática, eu sou democrático, e não posso simplesmente pagar um texto do P. só porque não gosto dele ou o acho mau. E o que se sucede aqui, aliás, não é uma coisa nem outra, muito pelo contrário.
Finalmente, respondendo às sugestões do Vash e do Marcus: como já expliquei, A Navalha não foi criada com o intuito de abranger este tipo de assuntos, mais terrenos e concretos. Fazem parte das pequenas, pequeníssimas excepções que criámos aquando da feitura deste lugar. No entanto (e como está até bem explicitado no nosso Manifesto d’A Navalha) regemo-nos pela regra geral da liberdade, liberdade, liberdade. O blog tanto é meu como do P., e cada um de nós postará o que quiser, sabendo no entanto que cada um respeita o outro nas suas ideias. Excepções como estas serão sempre bem-vindas, e quem sabe um dia excepções deixarão de ser, mas este é um ponto ao qual ainda usamos a expressão “quem sabe”. Não é, admito, minha vontade centrar-me nos problemas do país ou do mundo, aqui neste blog. Por estas razões e por outras ainda que aqui não referirei. Mas só posso agradecer ao P. a própria lufada de ar fresco que apresentou, dizendo que me subscrevo, totalmente e sem reservas, ao seu ponto de vista. A liberdade de expressão é um conceito tão variado quanto perigoso, e acaba a nossa liberdade onde começa a dos outros, mas como definir essas fronteiras? De relembrar que caricaturamos o nosso próprio Deus (digo nosso – o Deus com o qual fomos culturalmente, na nossa esmagadora maioria, criados), há mais de um século, e nem por isso somos uma sociedade mais degenerada que a islâmica. Não posso admitir que países que critiquem a publicação de cartoons como uma afronta aos seus valores pessoas apedrejem mulheres até à morte em praça pública por adultério ou as obriguem a casar com quem querem, escondendo-as com véus, maltratando-as, a não as tratando como merecem: com igualdade, obviamente.
Afirmo sem pudor algum que não têm qualquer razão moral de protestarem contra as nossas faltas de respeito e princípios perante eles quando são estes (e outros) valores morais que estão em causa.




















J.

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