sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Elisa

Elisa, pega na carteira e acompanha-me. Vê-me junto ao mar. Fico bem nesta pose, nesta fotografia? Esta fotografia vou queimá-la quando me magoares porque foi tirada por ti, Elisa. A minha mãe não sabe de i, e tem medo de ti, Elisa. Elisa, vou abandonar-te junto à praia. Quero que penses na tua vida toda, inteira, enquanto não regressas a casa. Com sorte, as nuvens ali em cima que já ali estão desde ontem dão uma ajuda, e pode ser que penses na tua vida, molhada. Há já muito tempo estão para desabar. As nuvens, Elisa. Não as tuas convicções.
Elisa, não vale desapareceres durante umas eternidades e depois voltares, mesmo que depois me digas sempre que estiveste fora por pouco tempo, e que para mim é que pareceu muito. Eu quero tudo de ti, Elisa, não te quero só aos bocados. Quero odiar e ter sono de cada cabelo e dedo teu, pega em mim quando estiver com uma overdose no sofá a rires-te, a minha boca a espumar amarelo, aqui no mar, ele a desabar e a ribombar contra a casa. Achas que dou um quadro bonito de neo-arte? Eu sou muito bonito, não sou Elisa? Eu sei que tu sabes que eu sou muito bonito, porque me queres devorar de cada vez que admites até que eu até sou um pouco mais do que nada para ti. Como vieste aqui ter, Elisa? Não há um carro nos arredores, o penhasco tem as escadas partidas e a estrada cortada desde o último vendaval, o mar não perdoa quem tente trepar a falésia, e não vejo aqui nenhum dos teus amigos ainda mais altos que eu e com um rosto mais cinzelado. Sou eu como os outros, Elisa, mas numa mudança espalhada de situações? Pára com esse sorriso ou arranco-to á dentada e segue-me, criança marota, tu que já violaste mais homens do que aqueles que os teus olhos têm a coragem de me dizer. Vou mostrar-te a minha música que tenho composto com gaita de foles e uma harmónica que encontrei caída no armário do meu quarto há umas semanas, é terrível, não é, cheia de agudos e desafinada, pensei em ti enquanto compunha estas peças, queremos destruí-las, como tu, mas não conseguimos evitar o fascínio que essa demência quase bonita de tão grotesca que é nos causa. Ao fim e ao cabo, são só músicas. Como tu, Elisa, que és só uma mulher de cabelo demasiado curto (e eu nunca gostei de mulheres com cabelo curto, não percebo), só uma mulher, só uma falésia, uma praia, um penhasco. Uma estrada cortada, um quadro por acabar a tentar demonstrar o diálogo perfeito que nos definiria, mas que está a meio numa tela quase branca, só o mar,, a explodir contra a janela, fotografias em que faltam lá corpos, existências, algo que te explique para além do teu corpo. Segue-me, Elisa, porque já sei que desaparecerás sempre e voltarás também sempre, podes pousar o casaco na cadeira. Olha como eu tenho uma cara maligna, maléfica. Não é bela? Mandei-a umas quantas vezes contra a parede, quando era mais novo, quando ainda te tinha na minha vida e a própria parede me dizia o teu nome no eco do estrondo. Diz o meu nome, Elisa, diz o meu nome se tens coragem, com o que o meu nome mesmo significa para mim; e faz sexo comigo por causa disso, usa e abusa de mim, parte de manhã com a chuva e as cortinas a entrarem pelo quarto adentro, a maré a subir, lá muito ao longe,, e um homem abandonado na cama, nu, com frio, a sonhar com o desejo de nunca acordar. Ou acordar, Elisa, e não ter tido nunca nenhuma Elisa na vida.








João.

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