segunda-feira, setembro 19, 2005

Talvez. - o idiota, parte dois.

A propósito de nada ocorreu-me prolongar esta noite com o simples intuito de esperar, de me cansar das horas mais demoradas. Gostava de poder provar qualquer coisa de magnânimo ao mundo e só depois a mim. Talvez pudesse com isso explicar o porquê de tantos momentos entregues à solidão de mais algumas palavras. Por ironia de circunstância ou simples placidez de espírito gostava de conseguir criar apenas mais um pouco, desejar agora e assim conseguir. Dizer algo de engraçado e matar seguidamente o riso, rezar ao portentoso deus-dará, não compreender o que significa, e tossir mais um cabrão que se me entranhasse na garganta. Medíocre, sentido, indefinido e agora posto a descoberto. Julgar assim, desconexo, como o centro de mais um espectáculo de cores – roxo e preto – mescladas. Eu agora sou psicótico – já me desejo; diria. Mas as palavras não podem ter assim tanta força – não, não podes compreendê-lo, não podes saber como é estar perto de ti, como é verdadeiro. Gastar o gás do isqueiro, brincando – como narrar o passado que se desfez, o presente que se aproxima. Não, as palavras não podem ter assim tanta força, mas gostava de concretizar: caminhada nos infernos, abanar a cabeça em estado de transe até sangrar do nariz, o homem, todo o homem no seu estado absurdo. E a vida não pode ter fundamento lógico para mais um pobre inapto. Os insolventes, como cães, como podem eles saber o que é desesperar pela falta de destreza, toda a falta de explicação, aquela piada crónica, quase mortal – sinto o meu coração preparado para desmaiar. Apenas mais um pouco de despeito; que força terá uma navalha contra o cinzento do silêncio. Levanta-se agora o criador cansado, procura nas ruas o pouco de decência que lhe falta. Não o olhem. Não comentem. Ela já se cansou de tentar provar o que quer que seja. Ele é o homem destoado da humanidade e é aqui, no plano do nada, que ele vos pode compreender. Talvez já tenha medo de morrer. Talvez já tenha dado tudo o que tinha para dar. Gastaram-se os dias. Vieram os fantasmas. Gastaram-se os desejos. Vieram as insónias. Não estou certo do que ele queria, mas levantou-se, seguiu os passos que ouvia um pouco afastados, vestiu-se a preceito, coberto de correntes, tornou-se uma peste, onde terá encontrado o fundo do seu podre? Houve um dia de merda que se prolongou e sentiu-se perdido. Teve pena de quem era e gritou alto que era vitima. Seria desculpado se fosse mais um génio perturbado. Confessou-se: Estou confuso. Já não há respostas – perdeste o teu tempo. Tenta agora esquecer, como eu fiz, quando percebi que as palavras não tinham assim tanta força.
Regressou a casa. Sentou-se no sofá. Ligou a televisão. E começou a chorar.





P.

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