Magrévia.
Sou um gajo simples.
Acho que posso ser um bom pai.
Acho que consigo não ser demasiado romântico.
Atrai-me o belo nas situações que não são belas por natureza.
Gostava de percorrer os desertos todos da Terra.
Gostava de, quando regressasse, fazer um jantar com todos os meus amigos.
Gostava de lançar um livro no mesmo dia em que lançasse um disco.
Gostava de conseguir falar fluentemente sete, oito línguas no mínimo: inglês, francês, alemão, espanhol, russo, indonésio, crioulo, outra qualquer.
Gostava de tocar saxofone.
Sei que um dia vou ter medo da felicidade toda que tenha conseguido ter. Esse dia vai ser tremendamente angustiante.
Gosto de ti. Gostava de poder lembrar-me: de como era esta expressão, antes de perder toda a sua força. Ou, o adoro-te. O adoro-te já não tem força nenhuma. O amo-te ainda menos. É necessário criarmos novas palavras. A primeira palavra que inventei foi para uma flor inventada. Isso não faz qualquer sentido.
Era uma Magrévia.
Gostava de aprender a tocar guitarra nos pântanos do Mississipi com um daqueles velhos pretos, desdentados, que venderam a alma ao diabo, quando eram novos.
Gostava que o meu filho se chamasse Rafael. Mas nunca lhe vou chamar Rafael. Porque toda a gente lhe chamaria Rafa, e eu acho esse diminutivo feio.
Se eu fosse um soldado…
Quero chamar-te pelo nome e tu perceberes tudo só com a força com que eu profiro as palavras.
O silêncio intromete-se entre nós. Eu devia saber.
Nós nunca aprendemos a falar através do silêncio.
Do Nosso silêncio.
J.
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