sexta-feira, junho 29, 2007

Kalimodjo

O pc estragou-se do nada. Um gorgolejar de sangue de computador, ou um asfixiamento que não ouvi, a paragem cardíaca de uma ventoinha, a morte por tristeza da motherboard, ele não soube o que foi, mas sabia que não se ligava mais, se ele tinha pedido ajuda, implorado antes dos segundos finais da morte, ele também não ouviu. Só sabia que estava morto, e que precisava de vida nova. Dêem nova vida ao meu computador, pediu ele aos deuses, dêem-lhe uma alma nova, mas mantenham a sua própria memória e a memória do que era antes. O computador foi embalado como um defunto na placenta de cartão que o viu nascer, e confiscado por mãos que nunca souberam o que ele significava para os que o amaram.

Os exames também foram brutais. As paredes ao pé dos anfiteatros vibravam com água e suor e nervos dos alunos, resfolegantes, angustiados, os sorrisos de quem não quer ver ninguém despido. Os tudo bens! Os como vais! Deus, sinto falta daqueles tempos, dos cinco minutos antes dos exames. Se pudesse voltar atrás para fazer a faculdade de novo fá-lo-ia só por esses momentos, os verdadeiros para os quais o aluno vive.
Estava a ouvir música quando me chamaram.
- Já sabes meu, já sabes??
- Não.
- A minha inocência acabou de morrer agora!
E saltavam, saltavam depois de um exame com as olheiras a bocejarem nas suas caras com diamantes de percevejos. Dinamene, disse eu. Que se passa com estes?
- Acho que inventaram uma nova teoria que destruiu por completo a base inteira dos direitos reais.
Saímos, fomos a bares, bebemos kalimodjo porque somos pobres e não, não conseguimos ter outros nomes que não estes, as motas ficaram em casa, os barcos só os daquele tio que não é bem nosso, dancei com um copo na mão a noite toda enquanto a minha gravata ondulava e o meu cabelo molhava, molhava e molhava o chão da discoteca pegajoso em rodelas de limão e testosterona perdida no meio da selva de luzes alucinantes.
- Os exames, os exames!!
Voltei a esquecer-me de quem era, e sentia-me como um guerreiro cuja arma é a caneta bic na mão
(vamos beber até morrer, ou até esquecer)

- Oh, estou a curtir tanto
Entretanto, o meu pc ainda não voltou. Uso o da minha mãe. Ninguém poderia pensar que o meu velho teclado seria assim tão velho. Ninguém poderia pensar que eu sobreviveria.
- Mas sobreviveste, disseste-me.

Pois disse.
É bom saber quando temos razão.


welcome back; J.

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