sexta-feira, abril 14, 2006

Éramos assim.

Esta dia está muito, muito terno, sei bem. Atravessando essa mágoa disforme a que chamam de impaciência, sobrevivo à indecisão entre lembrar ou apenas escutar. | Silêncio. |
Espero, entre as gentes repetidas, alguns minutos até perceber que não há forma de partir. Parar muito pouco para pensar ainda menos. A eternidade sussurrada virá depressa?, a vontade de me não perder, onde pára ela?
Sim, são concretizações híbridas.
Pedalavas com elegância no dia em que chegavas. Vinhas pela estrada que partia do palácio das indigências.
Perguntei, Que lugar seria esse, onde a fraqueza impera?
Disseste que não fugias, que raramente desviavas o olhar. Achei natural perguntar pelo teu nome. Fizeste uma pausa. Deixaste-a prolongar-se. Escondeste um sorriso tímido, abriste bem esses teus olhos brilhantes, deixaste a bicicleta cair com alguma violência. Lembro-me de imaginar o que aconteceria se aquele momento fosse saído de um musical. Se teria graça ou seria apenas absurdo. Provavelmente começavas a estalar os dedos, rodopiavas e por essa altura já cantarias uma canção qualquer a plenos pulmões, assim animada. ~
Mas não te mexeste.
Na verdade disseste apenas, Agora já sei para onde vou. E a tua frase pareceu rebentar-me no corpo. Estaquei, chocado, chocado, chocado. Parecias ter o destino traçado, ninguém te poderia trazer à razão dos comuns – já não pertencias àquele espaço.
Muito apressada, voltaste para a bicicleta. Colocaste nos pés nos pedais e, convicta, sentenciaste, Nunca fiques pelo receio da saudade. E foste. Nem tive tempo para te desejar boa sorte. Não importava: tinhas a descoberta a pedalar a teu lado.




Foto: C.






[A foto foi tirada a um placard publicitário, no café Buondi Spazio, perto da estação de Entrecampos; Éramos assim é o nomde do álbum dos portugueses Boitezuleika, que serviu de banda-sonora ao texto]






P.

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