sexta-feira, março 30, 2007

-




Dois anos de palavras entre o sério e o aburdo.
Obrigado a quem nos acompanha.




_

|

quarta-feira, março 28, 2007

Dia Mundial do Teatro

Cheguei atrasado à faculdade e decidi entrar pelas traseiras, já que a sala ficava mais perto. Na rampa de terra batida depois do parque de estacionamento, ao pé da porta, um sofá, velho de encosto alto, de cabedal castanho. Lembrei-me imediatamente da marquesa de médico que o meu amigo Rudy tinha encontrado no meio da rua e levado para casa para fazer um fantástico assento improvisado, e pensei Se tivesse uma cave ou um quarto maior, eras já meu. Saio da aula de fiscal quarenta minutos depois para ir ao bar tomar um café, e deparo-me com o mesmo sofá, bem no meio do espaço, atrás de uma porta transparente de madeira. Os tertulianos estão outra vez a fazer das suas, pensei, mas já nada me surpreende desde os carris em direcção a uma sanita bem no meio do átrio principal, com cartazes a dizer O CAMINHO PARA BOLONHA. Fumo o meu primeiro cigarro desde a segunda feira da semana passada, e abalo para comunitário receber a minha negativa estúpida, um nove tirado por uma unha negra, já que yours truly estava, nesse dia, digamos que não nas melhores alturas para fazer um teste. O bar, de novo, para tomar um café. Alguém quer ir ao bar? está lá um sofá. Lá estás tu com as tuas ideias malucas e o teu corpo e sorrisos tão perfeitamente esculpidos, disseram-me os indigentes. Ai não acreditam? Desta vez não estava só um sofá. Um matulão de um metro e noventa gritava frases trabalhadas a martelo com uma miúda vestida à yuppie dos anos oitenta com ketchup no lábio. O horror - era uma peça de teatro, e a porra do sofá nem sequer estava a ser usado. Isto se é arte contemporânea daqui a nada eles vão inventar uma desculpa para meter mamas ao barulho, disse eu. Depois de terem visto o sofá, decerto - acreditavam em tudo. O final veio estranho, enquant acendia o segundo cigarro e sorria á Íris, que me fez entender que aquilo era uma peça de teatro organizada pelo cénico de direito; o que fez com que nesse momeno tivesse suspirado de alívio ao nunca ter de facto para lá entrado, apesar de muita vez ter pensado nisso. Os aplausos foram frouxos, não percebi como acabou, fui para o meu primeiro café desde segunda feira da semana passada - de novo, a interrupção destes rituais teve sentido. O resto do meu dia foi relativamente banal - não fui à prática de obrigações, adormeci na cama dos meus pais a meio da primeira parte do jogo portugal - sérvia, e comi espetadas para o jantar - coisa incomum. Mas o melhor momento do meu dia? Ter visto a Íris, vestida de sopeira-dona-de-casa, com o cabelo meio seboso e um fantástico par de seios metidos dentro de uma bata que só a minha avó, de tão roxa, tão cinzenta e tão velha, usaria.


J.

|

segunda-feira, março 26, 2007

Sobre "Os Grandes Portugeses".

[Abro, excepcionalmente, na minha cabeça e n’A Navalha, um pouco de espaço para falar de um programa de televisão.]

Acabou mesmo há bocadinho o programa da RTP. O vencedor foi António de Oliveira Salazar. Foi um concurso de popularidade mascarado de documentário histórico que teve hoje o seu fim. Foram vários os episódios desta saga; quanto a mim, vi hoje pela primeira vez, a espaços, um dos programas. Este último.
Não me interessa dissertar sobre o impacto social deste programa, sobre as motivações de quem votou em quem. Não me interessa saber por que razão há sempre um certo saudosismo nos portugueses quando se fala no passado. Desde o início que me incomodou este programa. A sua estrutura surreal, que nos concede este direito mentiroso de escolher quem foi o maior português. E toda a estranheza: como escolher uma figura principal, quando entre os “candidatos” distam séculos de intervalo? Mais do que isso, como comparar um político, a um poeta, a um navegador, etc., e esperar que no meio de tudo isso haja uma comparação racional.
Não há. Só pode ser feito por brincadeira. E é como brincadeira que vejo “Os Grandes Portugueses”. Parecia óbvio, especialmente vendo à distância, que os mais controversos, e com probabilidade de terem mais votos, seriam sempre figuras do século XX. Era natural. É a memória a funcionar. Mas também há apenas 40 anos, Portugal era bem diferente. E Salazar era temido em Portugal. E criticado e gozado fora do país. Poucos choraram quando, após anos de ditadura, foi uma velha cadeira quem assassinou o pobre velhote, já gagá. Se a revolução de Abril, há 32 anos atrás, não foi violenta, nem sangrenta, ao contrário de todas as revoluções que se viram nos outros países, foi porque havia um consenso geral entre quem pensava a política em Portugal. As pessoas tiveram a “sorte” de a sentir na pele e na voz. Salazar e o seu legado não eram merecedores de vassalagem. Por isso o sistema estabelecido foi demitido.
Será natural, ao longo desta semana, ouvirmos e lermos em todo o lado sobre o por quê de uma vitória de Salazar. Que sim, que os portugueses estão insatisfeitos com a vida que a democracia lhes deu, que sim, que é só um concurso e que é apenas reflexo de quem, por Salazar, se soube dinamizar como pelos outros “candidatos” – e uso aspas porque acredito que nenhum deles quisesse ser sufragado por algo assim tão comezinho – ninguém o soube fazer.
Também não é isso que me importa. Certamente que foram muito menos os portugueses que votaram em Salazar, para grande português, do que aqueles que votaram no alentejano Zé Maria, quando se tratou de saber quem era o último a sair da casa no primeiro Big Brother, há uns anos atrás.
Também a televisão nos reserva destas pequenas mentiras.
Não sei. E é algo que vem desde há muito, mas eu não sei o que é a tão falada portugalidade. Não sei se é o fado, se as praias ou o vinho tinto. Se os pratos típicos ou as novelas que aprendemos a fazer, vendo as históricas novelas brasileiras da Globo. Não sei sequer por onde paira a minha própria portugalidade. E confesso um certo embaraço por isso. Não vergonha, entendam-me, apenas embaraço.
Sim, desconhecemos em boa parte Salazar. Em parte acho que o homem, como ditador, como filho da puta, que sinto que era, era-o filho da dita cuja com “p” pequeno. Nem como ditador foi grande. Foi um ditadorzeco comparado com tantos outros homicidas, e até genocidas, que um dia tiveram o poder nas suas mãos. Uma figura cinzenta, sem humor, algo sinistra, até. E para muitos um fantasma demasiado difícil de ser estudado. Mas tem de o ser. Para o bem e para o mal, é preciso saber ao máximo a razão que leva uma pessoa inteligente, aparentemente lúcida, a escolher a ganância, o crime, a ditadura. E acho que este programa de televisão não contribuiu em nada para isso. Nos seus cartazes de propaganda, Salazar surgia como D. Afonso Henriques, o primeiro rei de Portugal. Ele queria mostrar-se como um verdadeiro herói. Ironicamente, é já morto que atinge o seu auge. Sabe-se lá quantos milhares de portugueses o colocaram esta noite, acima de qualquer outro português na História, acima até das melhores expectativas de Salazar. Afinal de contas, décadas depois, os livrinhos adulterados de escola que Salazar vendia à mentalidade “povinha” surtiram efeito…
E tudo isto foi, no fundo, só polémica, à boa maneira portuguesa. Fez correr tinta, e muita mais há-de fazer correr. E não creio que demore muito tempo até ser recordado como um programa caricato, idiota. E também nisso a posição da RTP sai prejudicada. Queriam, pelo que disseram, despertar a atenção dos portugueses para a sua própria história. Acabaram por embandeirar quem não queriam. Esperemos ao menos que as audiências tenham compensado.
Eu, por mim, sempre me senti na necessidade de desvalorizar o programa. Hoje faço exactamente o inverso. Precisava de me explicar, de contar o arrepio que certas coisas me provocam. Eu nunca poderia saber escolher quem foi para mim o maior português. Não desta maneira, com esta coisa toda “popularesca” à mistura. Fiz o que achei melhor: não votei.
Não foi suficiente para tudo o resto. Mas foi suficiente para mim.







P.

|

domingo, março 25, 2007

La Mer




Para nós, o Mar é um homem. Para os franceses é uma mulher.
Para mim, La Mer é uma música do caraças.

J.

|

sexta-feira, março 23, 2007

Tou outra vez com net

Escondam as crianças e os pacotes de kinder bueno.


J.

|

São dias rápidos na sua lentidão. Levantar de manhã cedo, despachar-me, comer qualquer coisa a caminho da faculdade. Tomar um café antes de entrar na sala, poucos minutos, segue-se hora e meia a ouvir, sentado. Aulas, almoço, aulas, tempo morto, um café com alguém ao fim do dia, já longe da faculdade. Uma conversa, banal ou nem tanto, um cigarro e um pouco de rádio enquanto conduzo. Já falta pouco até entrar em casa, jantar, e cair redondo no sofá, já com sono, acordar uma hora depois, computador, mais um texto, uma proposta de trabalho, ideias profissionais quando a imaginação não tem sido das melhores. É tarde. Como ontem e nos dias anteriores já é tarde. Vou dormir, ouvir o som estridente do despertador quando a manhã, também ela, vai acordando devagar, ensonada.

Despacha-te, P.

Com um pouco de sorte ainda vais a tempo tomar café antes de entrar na aula.

Foge de mim, rotina. É que tem sido difícil fugir de ti.






P.

|

quarta-feira, março 21, 2007

21 de março...

hoje começa a primavera. hoje é o dia mundial da poesia. hoje é o dia da árvore, e também da água. e do sono.

Hoje é o dia do sono.

E eu tenho sono. não sei se ainda vou escrever algum poema, se vou plantar alguma árvore. sei que vou beber água, sim. hoje é um dia muito...ocupado. decidiram compactar tanta coisa de uma só vez.

eu percebo.

hoje é um dia como tantos outros.
assim diferente por acaso.

dia 21, sim, e pode ser que a primavera traga qualquer coisa de bom, desde que tenha poucas cores.
as borboletas e as flores e a porra das hormonas tratam do resto.






P.


|

terça-feira, março 20, 2007

Livros, parte 2

- O que eu achei do livro? Muita mau. Desculpa. Mas ok, era mau. Qual foi a cena de os meteres todos no sétimo capítulo a trocarem de corpo? Isso não faz sentido nenhum! Como é que me explicas isso?
- Mas não era isso, era, quer dizer –
- Acho que devias dedicar-te à indústria pornográfica, porque és melhor na cama do que a escrever.
- Isso é um insulto lixado quando o escritor é virgem.
- Mas como é que te aceitaram isso?
- Bem, quer dizer…depois da história do submarino, a Quasi achou que eu tinha público para o livro e deu-me a chance… mas está assim tão terrível?
- haaaa, deixa cá ver…está.


Guardanapos pretos
Black Napkins
A Sensualidade da Guitarra
Huuum
Por vezes, a solo, eu
-



- Por exemplo, este poema: terrível, também.
- Penso que é um elogio à neo-pop-art, e –
- Isto não é “neo” porra nenhum meu, isto é mau. Isto é de deglutição difícil.
- Ok, estou Insatisfeito contigo. Insatisfeito. Primeiro, ok, apoiavas-me, estava tudo bem e era porreiro, acho que gostavas de andar com um escritor. Depois quando escrevi o meu livro e depois de me teres apresentado a todos os teus amigos artsy e de tertúlias intermináveis no bairro e nesses bares de merda espalhados por aí, fartaste-te de mim e dizes que sou uma seca na cama na cozinhar e vou sempre passear para os mesmos sítios, quer dizer, até expulsaste o caralho do cão de casa!
- O Bóris sujava tudo em que –
- Não, não, tu não gostavas do sacana do cão porque era meu e deste-o aos teus primos para não teres problemas, ok? E depois começaste a foder-me o juízo com as horas em que eu escrevia, proibiste-me de tocar saxofone em casa por causa do barulho e começaste a andar mais com os meus amigos do que eu. Tipo, que raio é isso?? Encornaste-me, hã sua atrasada mental, encornaste-me nestes últimos meses por acaso, também? E tudo o que eu pedia era um bocado de calma para acabar a merda do livro, e agora cais-me em cima a dizeres que está terrível! Mas que merda é esta?? Querias andar com um bom escritor, era isso?
- haaa… por acaso…sim.
- Olha, fode-te.
- …Só te encornei com o Jaime.
- Foda-se, ao menos agora dás-me sinceridade.
- O décimo capítulo não está assim tão mau…
- …A parte em que a Raquel, que afinal é o Filipe, é morta por um cavalo da polícia?
- Podias ter exagerado um bocado a sensação de pânico.
- Ela está em coma, estúpida, não há pânico para ninguém. Com o Jaime? Quando?
- Quando voltávamos do japonês e eu te pedi para ires indo que preferia apanhar um táxi.
- Então não estavas mesmo maldisposta?
- Estava… mas pronto, aconteceu à mesma.
- A minha vida se calhar até dava um bom livro.
- É. Mas para isso tinhas de acabar comigo.



J.

|

sábado, março 17, 2007

Serviço Público

Cortei o Cabelo. O meu pai viu-me e disse "Pareces um gay". Já reafirmou esta ideia ao longo da noite passada.
Uma amiga minha diz que estou "super podre" e que me comia todo (antes do corte não o teria feito).
Bom, fui ao Cabaret Maxime tirar as dúvidas. Nada. Porém, TV Rural deram um concerto bem porreiro.
Mas acho que menos miúdas olharam para mim no metro.
oh deus, a minha vida é tão complicada.


J.

|

quinta-feira, março 15, 2007

antecedências

Disseste que sim, com violenta humildade.
E durante algum tempo conseguiste enganar-me.



P.

|

quarta-feira, março 14, 2007

de mim.

Pensando bem, talvez tenha sido da tarde triste que tentámos remendar. Talvez tenha sido do que não soubemos dizer. Sim, é possível que seja sempre prematuro dizer que se resolveu alguma coisa. É certamente a magnitude do que perdemos que nos faz relembrar o que um dia decidimos aceitar.
Eu sempre pensei no adeus. Na força que acarreta, no que o torna tão bruto. No quanto nos embrutece, como se para os últimos instantes sobrasse sempre uma piada carregada de ironia. Sinto-me transfigurado. Sem delicadeza ou beleza alguma, sem nenhuma revelação, apenas me sinto.
E prolongo-me, Através dos dias que já não sei reconhecer, percepciono apenas as pequenas partes de mim que se vão dissipando. Um dia somos tudo. Na maior parte dos outros visitamos o limiar da incerteza, povoamos o espírito com a desconfiança típica de quem aprende as lições pela força de um estalo.
- Mas controlo-me -
Faço-o como se fosse um lamento, como se tudo o que algum dia me pudesse iluminar já tivesse sido descoberto. Como se cada vez em que se procura a poesia dos momentos que compomos, se tentasse apenas evitar o óbvio.
É cansaço; porque tudo é cansaço quando esquecemos por que se luta. E há sempre algo que toca as paredes do demasiado. Há sempre algo que vai além do êxtase, que vai além da esperança, que vai tão além que só se torna visível durante um pequeno nada. E enfim fragmenta-se.
Hoje decidi terminar a minha fome dos sentidos. Hoje decidi que há procura, ainda, pois de tempos a tempos só a dura confusão nos mantém alerta. Hoje decidi-me pela indecisão de quem são. Um dia criarei um outro eu qualquer. Um eu que não se lembre de mim e que me abandone. Um dia serei a minha própria mercadoria perdida - serei peça sobre peça, um simples puzzle de desejos e frustrações que um dia teve P. como nome.
Um dia já não me serei.
E vou esperar. Sentado no chão, encostado a uma parede qualquer com os dedos a prender os cabelos vou conseguir visualizar-me para além do cansaço. Vou deixar de pensar em mim. Estarei resolvido como jogo e como ser. Derrotado, esquecido de mim próprio, abandonarei o meu corpo como se me limitasse a trocar de pele. E com os dedos a agarrar com ainda mais força nos cabelos, vou dizer baixinho que Já não sou. Com sorte, sem nunca ter sentido raiva, perante o meu último esquisso de lucidez, vou acabar. Recordando o óbvio.
A inspiração é uma mentira. E amar é pouco mais do que um grito.





P.

|

terça-feira, março 13, 2007

Hoje...

Esqueci-me do teu aniversário.

J.

|

domingo, março 11, 2007

Frases, Textos, Letras

este podia ser um texto em que começaria comigo, à cabeceira da tua cama, a fazer-te festas, e a acariciar-te o cabelo, para adormeceres. e seria talvez passado num passado que me sabe bem recordar, ou num presente, que não julgo ser sequer possível. ou a reencontrar-te anos depois, no meio da rua, e não me recordar já do teu nome - apenas da tua essência. a subtileza das palavras, os gestos. nada seria poupado. o texto seria assim. diálogos, poucos, talvez, sem travessões.

Não há textos assim que não sejam clichés, bocejos, femininos, no sentido negativo da palavra.

e no entanto, de vez em quando, somos tocados pela beleza. temos de ser, é inevitável a catarse ocasional, a procura pelo belo quando, de vez e quando, os dias parecem mais reais, mais lanças de luz no meio da escuridão das nossas vidas, e decidimos sentir. não me engano. sei que tudo pode ser momentâneo, e o que para mim faz sentido não fará sentido nunca mais para ninguém da mesma maneira. isto não é solidão? acho que o amor é a única coisa que consegu anular a solidão.

os parágrafos dissolvem-se, as vírgulas nascem como cinzas, invocam-se memórias que nos surgem sem aviso, explode o Sol de um Verão na face, ou o Vento de um Outono no nosso corpo, abraçado a alguém. também isso se dissolve. se dantes olhava nas pessoas em busca de uma mentira que surgiria, hoje suplico que alguém me diga que existe uma verdade nelas, por mais inútil que seja. e dizem-me: pensas demasiado.

é verdade. já pensei nisso, e já cheguei a essa conclusão. penso demasiado. o porquê? nisso não penso, lá está - dá muito mais gozo não o saber, e descobri-lo por acaso.

porquê continuar a escrever? quem me dera saber. o irónico é que, nessa busca, poderia escrever um texto muito bom acerca disso - a resposta, no entanto, continuaria a escapar-me.

um dia disse: estou condenado a escrever. nunca me importei muito com a existência do destino. mas, talvez, seja reconfortante sabê-lo - sou um prisioneiro da minha própria liberdade.

isso, e continuar a imaginar-te. imaginar-me, portanto. perder-me, perder-te - a resposta é óbvia.

existes apenas porque eu existo.



J.

|

sábado, março 10, 2007

Flavours

"Company Cars and Shoes were never meant to play the Blues

You were the only fool I've ever wanted to make love to

Even within my youth I denied I wanted to

Cuz' you were the only fool I've ever wanted to make love to



Gomez

J.

|

quarta-feira, março 07, 2007

O Mundo Moderno

Não tenho medo do mundo lá fora,
Do mundo moderno nem tenho medo dele
O mundo moderno está cheio de caras conhecidas noutros tempos,
Em que eu era fantasma, e escritores que só publicaram fumo
Ou caçadores de porcelanas foragidas

Os dias continuam a ser bem reais cá dentro, cá dentro
Onde está bem quente, e o mundo moderno não chega
Para matar o ócio das horas em que percorro
Os labirintos da mente e chego sempre ao ponto onde comecei
Que foi talvez amar-te? Yá,
Que foi talvez amar-te.!, perto do fim de uma música
Mais moderna como o mundo que reneguei
Quando nos despedimos ante o Céu pregado a sangue e nuvens numa utopia de sentidos.

O mundo moderno tem folhas no Outono que cheiram
A infâncias violentas e a ferocidades indolentes
E os teus dentes e os teus cabelos estão pregados às árvores como os ramos
Que os miúdos não destruíram ao sair da escola,
Prestes a vingar
E eu percorreria noutros tempos esses caminhos com tempestades eléctricas
A senti-las na mente e dobrava-me no chão
A dor deixava-me feliz porque pensava
Eram epifanias

O caçador de porcelanas foragidas ouviu o meu grito ao longe
Ninguém me caçou, nunca me apaixonei pela tua sombra
Mas ouviste-me um dia estava eu a pregar o fim do mundo como não o conhecemos
E decidiste que eu talvez não fosse ridículo no meu desespero
E os teus amigos com pinturas a óleo na cara sorriram como o Grito do Munch
Foi amor à primeira vista com o narcisismo do teu próprio contemplamento
E o mundo moderno sorria também, a observar
A forma como as realidades todas equidistantes
Se dobravam entre si justamente naquele momento mais específico
E totalmente impróprio e improvável.

O mundo moderno renegou-me ou eu talvez a ele
Quando os livros todos ganharam asas e escolheram nomes sem usarem letras
Os rios fizeram greve ou talvez foram os meus olhos que se inverteram, como
A minha paixão por ti, ou a minha loucura
Por tentar encontrar o belo nas coisas mais impróprias
Foi a minha loucura ou foste tu?

O castanho dos dias volta a regressar,
Por si mesmo
E o meu amor pelo mundo moderno acabou
Eu era ainda humano (ou
Era o mundo que não estava cheio deles), e os prédios cantavam canções
De saudade e perda, como as pessoas
E o mundo moderno aplaudia dentro de si mesmo
E eu voltava a partir em mais uma viagem interior
Pelo comboio, ou pelo cosmos
Antes de te vir ou imaginar que não existias,
E era feliz,
Nos meus sons
E nas minhas impossibilidades, e tinha sono
Por vezes, tinha sono
Mas gostava do meu nome
E gostava de perder coisas, de regressar, de me voltar a encontrar
Quando as coisas ficavam mais complicadas…
Mas reneguei a existência de mim mesmo
Por ti, ou talvez por mim
Por achar demasiado insuportável estas noites e estas manhãs
Cinzentas ou cheias de sol a prometerem esperança
Quando se conhecessem o teu nome
O próprio mundo se fechava em si mesmo
Em agonia.




J.
Feito hoje, para A Navalha

|

sexta-feira, março 02, 2007

Muito devagarinho vou queimando os dedos na ponta dos fósforos. muito devagarinho vou-me deixando cair às pancadas secas, enrolo-me já inerte pelo ar abaixo eu agora sou parte do que já não penso. vou. e aos dias que se me escapam por entre os dedos como areia, vou chamando de sensações. leves na sua placidez. concretas no cancro em que se tornaram. eu agora tenho-as, enquanto fecho os olhos e me recosto, derrotado, preparo-me para amar sem saber. assim me tenho ou talvez eu devesse ter sido esse instante em que a música se adormece a si própria, eu podia ter sido uma
decisão.
De destino. afagado por leves festas de palma aberta. De concreto. enquanto se prolonga como o eco numa imensa gruta. é esta a minha noção de infinidade.
E desequilibro-me de nós.
fecham-se as persianas, aproximam-se as cortinas uma da outra, um véu é colocado sobre a cara, alguém que reconheço afasta-se na direcção da porta. chamo baixinho, mas já ouço, suave, o clique que já não me deixa sair, e apercebo-me.






[Exercícios]





P.

|

Ou seja:

.

E resumindo o post anterior...

Eu quero é queca.



J.

|

!..

Estou deprimido.
Não, estou angustiado.
Digamos, entre o deprimido e o angustiado.
Foda-se, é uma coisa estranha. A depressão empurra-nos para dentro; a angústia, por seu lado, empurra-nos para fora.
Delírios de adolescente, talvez. Sim, acredito que sim – talvez, apenas talvez. Deixa-me reformular: estou deprimido e angustiado. Deprimido pelas coisas que já fui e ainda continuo a ser: angustiado, pelas coisas que quero ser e em breve não serei.
Chego á conclusão que me lamento. – portanto. Há o desejo desesperado de fugir – a angústia – não, mas a sério, fugir, largar tudo, o fugir mesmo, no meio da rua, de nada – de mim mesmo, talvez, e só parar quando a boca me souber a sangue. Quando me tiver esquecido de tudo aquilo que me angustia – quando o cansaço for maior que a angústia. Ou seja – correr durante horas
Horas
Horas.
Parar junto ao mar.
Olhar o mar, mãos nos joelhos, a respiração ofegante (meu deus, como eu desejo a respiração ofegante), angustiar-me mais. Mais.
Sentir que… como explicar.
Sentir que se gritasse o meu nome ao vento nada se ouviria.
- O vento
Só me devolveria o próprio vento.
Para dentro: a depressão. O casulo, a posição fetal. A inércia, ao contrário da acção desesperada, pela própria angústia. Maldição, o próprio desprezo pela piedade de mim mesmo em relação a mim, portanto. Um segredo que existe somente pela vergonha, mas vergonha dessa própria vergonha, e desse próprio segredo. Por fim, o
desistir.
: a depressão.
Deprimido e angustiado – o sentimento desesperado – verdadeiramente, acredita, verdadeiramente – de deitar a mochila e o casaco para o chão e fugir, mas a depressão a aumentar com a própria fuga. A desistência total de encetar, sequer, a própria fuga.
O desistir antes da fuga, a angústia somente. O aumento da depressão pela frustração, mais uma vez, do que fui e sou, daquilo que queria fazer – fugir, partir, formar uma banda, ou desaparecer e ir para um deserto qualquer, esquecer-me da própria língua.
Renegar-me, portanto. Sentir o vento salgado do mar, a respiração ofegante, o cansaço de já me ter esquecido da própria angústia, e ela regressar quando gritasse o meu nome ao vento, e o vento só me devolvesse o vento –
Tudo, tudo negado; o fim antes do começo. Para dentro. Para fora. A implosão da mente, o desistir de sequer tentar perceber o porquê. O porquê da depressão, o porquê da angústia, para dentro, para fora, foge. Não. Liberta-te, larga tudo, Não.
Delírios de um adolescente que já devia ter partido – sim, talvez, admito que talvez. Admito que a angústia e a depressão geram raiva, quando combinadas. E raiva da própria angústia, raiva da própria depressão, que alimenta mais a raiva, que alimenta mais a depressão e a angústia, que alimenta ainda mais a raiva, que alimenta
O grito ao vento.
Que aumenta;
Que aumentam
Com o próprio silêncio –

Acho que – se o fizesse, claro. Estou a escrever

Do vento
A devolver o meu silêncio.




J.

|